Na rua 15 de Novembro, no trecho da Praça Dom Moura, mora uma mulher que está completando 90 anos de idade. Um tempo de vida pouco comum para uma pessoa pouco comum, que se diferencia não pela longevidade mas pelo que tem sido capaz de trazer e partilhar no seu tempo de vida e no que será capaz de deixar depois dele. Escritora e, sobretudo, mestra, este é seu único patrimônio: o título definitivo de mestra. Que indica a capacidade de uma pessoa ir além do seu espaço intelectual e de entrar no espaço alheio - consensualmente - enriquecendo-o. Quando isso se dá durante toda uma vida - como é o caso dela -, significa doação. Dar-se para o bem, porque assim crê. O outro patrimônio, material, inexiste. Foi-lhe negado por uma sociedade que faz crescer as nulidades, dá tudo a jogadores de futebol e muito pouco - quase nada - a seus mestres e cientistas.
Essa nonagenária - que aniversaria no mesmo dia dedicado ao aniversário de Jesus - é conhecida pela sua devoção cristã. Ela sempre carregou e deixou visível sua imensa fé em uma força superior regendo a vida de todos nós. O que faz dela uma pessoa ainda mais diferenciada, porque quem a conhece sabe que não se trata de curvar-se pelo medo do transcendente. Do que pode vir como ganho ou perda. Ela tem uma fé imanente, é parte inseparável de sua história pessoal, um enredo singular que está presente nos artigos de jornais, na poesia - aceita no suplemento literário do Diário de Pernambuco nos anos 1950 sob a direção de Mauro Mota, sabidamente rigoroso no acolhimento de colaboradores -, e na ficção juvenil que lhe daria o título de uma das maiores escritoras contemporâneas de nosso País se seu berço tivesse sido o Sudeste, onde as coisas parecem acontecer mais, e melhor, inclusive na atividade cultural. O nome dessa mulher é Luzinette Laporte, de quem eu ouvia falar-nos meus tempos de Colégio Diocesano - com uma espécie de respeito litúrgico a quem está acima do bem e do mal. Um respeito-devoção que deveria persistir hoje sobretudo entre os que tiveram o privilégio de ser seus alunos, suas alunas, o que não parece ser o caso e é pena. Não por ela, mas pelos que mergulharam na correnteza da vida sem perceber que não existe neste rio comum a todos vida isolada de outras vidas. Principalmente das que dão a seiva que faz s história do crescimento intelectual e fermentação de valores estéticos, éticos, morais, humanísticos. Como sempre fez esta mestra para quem, felizmente, existe o acolhimento no setor cultural do Sesc, onde lhe foi dedicado um espaço próprio, resgate de um tributo que deveria ser de toda a cidade, de todos os colégios, de todas as crenças, porque se trata de reconhecer a presença de uma mestra que doou sem esperar nem exigir retorno. (Transcrito do Jornal 'O Século' de março de 2016).
*Jornalista, escritor, cronista e historiador.
João Marques
Luzinette Laporte, natural de Catende - PE, veio para esta cidade muito jovem e estudou no Colégio Santa Sofia. Tornou-se professora de Português e de Francês no Colégio onde estudou e no Colégio Diocesano de Garanhuns. Professora da grande simpatia de seus alunos, acaba inesquecível por todos e marcando época entre a grande geração de mestres em Garanhuns. Escritora, foi quem mais escreveu artigos (crônicas) para o jornal O Monitor. Foram anos e anos de colaboração semanal. Escreveu vário livros, ficando mais conhecidos ''A Menina que Falava com as Coisas', 'Amor de Mulher' e 'O Homem com Girassóis no Olhar'. Este último premiado pela Academia Pernambucana de Letras. Homenageada com seu nome numa sala de eventos culturais no SESC local.
Luzinette Laporte foi uma das últimas pessoas de cultura daqui, dos anos 50. E um dos últimos professores do passado. O seu desaparecimento representou grande perda dos nomes famosos de Garanhuns. Ela está colocada entre os maiores vultos de cultura que passaram por Garanhuns. Escreveu muito tempo para este jornal, O Século, também. Nossas homenagens e gratidão a Luzinette Laporte de Carvalho.
A professora e escritora Luzinette Laporte de Carvalho, faleceu na noite de 18 de dezembro de 2017.
Nenhum comentário:
Postar um comentário